sábado, 2 de julho de 2016

Chapeuzinho Vermelho

Isso foi uma conversa em chat. Removi as partes ditas pela outra pessoa, mas acho que dá para entender. Não é um estudo formal, é só um ajuntamento de ideias a partir de várias leituras que fiz.

[Loba Manca]: Então, a história da chapéuzinho vermelho segue o padrão de iniciação xamânica. Em várias tradições, o primeiro passo da iniciação é um sacrifício animal. A pele desse animal, virada do avesso, é usada para fazer o manto ou as luvas do xamã. O chapéuzinho vermelho poderia ser entendido como um manto xamânico, que é uma ferramente imprescindível do trabalho em alguns settings, e por ser uma pele fresca ainda, ser vermelho, ou ser pintado de vermelho com sangue ou ocre, porque é tradicional em diversos rolês de iniciação. (sim, é meio grudento isso. mas é aporrethon, é aquilo que não pode ser posto em palavras para ser explicado, esse se lavar de sangue. é difícil explicar, mas é um negócio que coloca vc através da barreira vida-morte-vida, o que prepara a próxima parte do rolê)

[Loba Manca]: Uma vez que o processo de iniciação é começado, vc está tecnicamente, morto.

[Loba Manca]: É o limbo iniciático.

[Loba Manca]: O passo seguinte do processo é uma jornada. Você precisa ir, sozinho, cumprir uma missão ou encontrar alguém. No caso da chapéuzinho, isso pode ser representado por levar doces para vovó, que é uma figura senescente, uma mestra ou espírito ancestral, que vive afastada da sociedade, como é bastante comum que xamãs de várias culturas vivam. Curiosamente, doces são uma oferenda comum para diversos tipos de espíritos e divindades. Mel, geleia, pães, bolos, as descrições de doces são descrições clássicas de oferendas.

[Loba Manca]: E a jornada sempre inclui o risco, porque é o momento em que você sai da realidade consensual e vai pro mundo dos espíritos.

[Loba Manca]: A primeira regra do mundo dos espíritos é: todo mundo tem seus próprios objetivos. Tudo que se mexe e boa parte do que não se mexe é perigoso.

[Loba Manca]: Então ela encontra um espírito Lobo. E o Lobo é o caçador voraz e sempre faminto, um espírito invernal. Mas também é um iniciador, um professor que não questiona quem diabos vem aprender com ele. Só cumpre sua função.

[Loba Manca]: E é isso que ele faz com a Chapéuzinho: ele ensina para ela os caminhos da floresta. Ele aponta as trilhas, e propõe que ela escolha por onde vai andar. E ai a gente tem uma coisa que é muito do processo iniciático, que é o guardião do portal, aquele que fica na encruzilhada e te indica as possibilidades do que vai passar adiante. Mas que não escolhe por você.

[Loba Manca]: E que precisa ser convencido, derrotado ou apaziguado para você passar.

[Loba Manca]: E ai vc tem duas versões da história: uma a Chapéuzinho divide com o Lobo o que ia levar para avó. Isso apazigua o Lobo. A outra ela recusa a dar alguma coisa para ele comer - e isso deixa um espírito muito puto.

[Loba Manca]: De todo modo, ela passa pelo primeiro encontro pelo Lobo, ou sob a proteção ou sob a maldição dele. Ele indica para ela onde estão os arbustos com frutinhas. E ela come as frutinhas.

[Loba Manca]: Comer do alimento do mundo dos espíritos te deixa ligado àquele mundo.

[Loba Manca]: Ela a partir desse momento, está um passo adiante no caminho de ser xamã, porque agora ela está ligada ao mundo dos espíritos, ela comeu do alimento dos espíritos e agora não pode ser removida por completo disso.

[Loba Manca]: Enquanto a Chapéuzinho faz isso, o Lobo vai encontrar a Vovó. E ai a gente tem que pensar que devorar pode ser interpretado como um "mesclar-se a", com "ser parte de".  Em mitos e lendas, ser devorado muitas vezes significa que você está na barriga da baleia, vc está mergulhando no mundo dos mortos para retornar de lá com alguma coisa.

[Loba Manca]: Ou pode ser que devorado e devorador sejam na verdade dois aspectos de uma mesma coisa que estava quebrada, rompida. Então quando um devora o outro, eles voltam a ser um só.

[Loba Manca]: A vovó e o lobo podem ser vistos como diferentes espíritos dentro da família de espíritos aliados da menina.


[Loba Manca]: E ai ela chega na casa da vovó, com as oferendas, depois de ter atravessado a floresta, que é um aspecto bem tradicional de representação do mundo espiritual. E encontra o lobo. Ela entrega as ofertas, e ai ela é morta pelo lobo.

[Loba Manca]: Só que é assim que funciona a iniciação xamânica. Você tem que morrer

[Loba Manca]: Seu corpo espiritual é desmembrado e recosturado, e nesse processo de recostura, você passa a ter elementos dos espíritos em você.

[Loba Manca]: Porque antigamente o fio de costura era feito com tendões, então vc basicamente tá usando um outro espírito para costurar os pedaços do xamã


[Loba Manca]: Então, dentro da leitura xamânica da Chapéuzinho Vermelho, ela É o Lobo.

[Loba Manca]: Porque o Lobo é o iniciador dela, o espírito que se alia a ela para que ela saia do outro lado.

[Loba Manca]: Ele representa o encontro dela com a sombra e o que sai do outro lado, que não é mais a pessoa que era antes, mas uma pessoa nova, renascida.

[Loba Manca]: Basicamente é isso.

[Loba Manca]: Porque o rolê do caçador é uma adição posterior.

[Loba Manca]: Cacete, até cansei.

[Loba Manca]Cara, o grande lance do processo de iniciação é que ele é perigoso

[Loba Manca]: Ninguém garante que vc vai sair inteiro do outro lado. Tem uma miríade de fatores que podem interferir. Por exemplo na versão em que o Lobo fica puto pq ela não dá a oferenda para ele na floresta. Ele poderia simplesmente abandonar ela lá e ela ia ter que se virar perdida na floresta, e encontrar coisas que simplesmente iriam dar pra ela um destino pior que a morte.

[Loba Manca]: Todo xamã tem um pé na loucura por causa desse processo de morte-renasciment

[Loba Manca]: Alguns enfiam o pé na jaca completamente. A morte da chapéuzinho poderia ser isso.

sábado, 23 de agosto de 2014

Alguns pensamentos em uma manha ensolarada de sábado - minha vivência de gênero.


Apesar de tudo, eu gosto de ser quem eu sou. Gosto de ser uma mulher de trinta e poucos e gosto de ser um garoto louco que sempre vai pulsar dentro do meu peito.

Não sou andrógina, meu corpo grita essa necessidade terra, essa coisa de touro e de cordeiro, e isso não me incomoda. Minhas ancas largas e meus peitos fartos me fazem fonte e eu alimento a terra e a água quando danço. (mesmo que as vezes, muitas vezes, eu quisesse o corpo esguio de mulher árvore, longilíneo e delicado, ligando terra e céu, e mais vezes ainda o corpo construído de músculos perfeitos e agressivos que me dessem a aparência agressiva e furiosa do meu coração).

Gosto de ser mulher. O que eu já achei que tivesse algo a ver com meu corpo físico, e com o tempo e o conhecimento e a empatia, percebi que não - se eu tivesse um corpo lido como masculino, eu seria mulher do mesmo jeito. Gosto do simbolismo agregado ao conceito, do ctônico e sombrio que um deus, apesar de masculino, me ensinou a amar em ser mulher. Gosto, e embora gosto se discuta sim, tenho o  direito de depois de muito analisar e pensar me sentir confortável nessa pele. E se eu luto para que as mulheres possam ser quem elas quiserem do jeito que elas quiserem é exatamente porque eu gosto de ser mulher - e ser mulher é um significado todo meu que construí para mim a partir de minhas vivências, que são só minhas porque sempre fui uma outsider, tanto quanto pela sociedade onde eu me inseria. Sou mulher porque sou mênade. E isso me define.

Gosto de ser um garoto. (porque quando a sociedade nega o poder a um homem, o chama de "garoto" ou "mocinho", e socialmente falando eu nunca atingiria o patamar cobrado de um homem, seria/serei sempre mocinho, garoto, mesmo aos oitenta anos de idade, porque meu corpo e meu documento diz para as pessoas que sou uma mulher.) O que me fez sentir muito confusa por muito tempo até perceber que não existe nada de errado em alimentar tudo o que me faz bem, e o dândi e que habita aqui dentro está incluído nisso. E não é uma questão de pensar que sou uma mulher com características masculinas. Não. Eu tenho uma percepção não binária da coisa e me sinto genderqueer. Uma parte de mim é um homem. Um cara que aprendeu a cultuar Rhea e dançar na noite com os leões, e que é devoto de Ares, um deus sempre pronto a proteger e defender as mulheres, apesar da fama de violento.

Eu vejo a questão do gênero como um aspecto religioso/espiritual, para mim. As vezes penso em mim como alguém que tem dois espíritos, alguém que tem um processo xamânico de ser sempre à margem, entre o masculino e o feminino.

Meu gênero?

Eu sou a dança entre uma raposa e uma coruja.


Mas não vou achar isso na hora de preencher o formulário.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Algumas anotações sobre transe

Eu tinha onze anos quando comecei a praticar meditação.

Não sabia que aquilo que eu fazia tão naturalmente tinha um nome. Me lembro de ter cinco ou seis anos de idade e minha avó sentar na beira da minha cama para eu rezar e dormir, e das palavras dela eu não lembro, mas lembro de entrar em um estado de vigília onde a visão parecia coberta de nuvens e onde eu podia sentar e ouvir ensinamentos daqueles para quem eu orava como se não estivesse mais no meu corpo.

Quando pequena, eu gostava de girar e girar e girar no meio das árvores, até ficar bem tonta, então me jogava no chão no meio das árvores, e via o céu mudar de cor e as árvores dançando. Hoje vejo meu filho repetindo o mesmo ato e penso que preciso passar mais tempo com ele entre as árvores - e que bom que ele tem alguém para dizer a ele o que é isso tudo que ele vê.

O fato é que com onze anos eu comecei a praticar meditação e um dos motivos disso era conseguir dominar esse processo. Me aterrar e focar de forma a não fazer isso sem intenção. Meditava todos os dias e com isso conseguia um controle bem melhor.

Até hoje, eu tenho uma facilidade para o transe que pode parecer uma coisa ótima - e seria, em uma sociedade onde eu pudesse ocupar o nicho social de que essa é minha função na comunidade - e onde assim sempre houvesse alguém capaz de me puxar de volta quando fosse preciso.

Na faculdade, ensinei um amigo a como me trazer de volta, porque era muito comum que durante uma aula mais intensa que eu mergulhasse dentro de mim e saísse por completo da realidade consensual. Ele, com quem tenho uma conexão profunda e natural, mesmo que hoje não possamos nos ver mais, foi a pessoa que aprendeu a fazer isso com mais gentileza até hoje. Por termos essa conexão intensa, ele conseguia perceber que algo estava acontecendo, e chamar meu nome em um certo tom que me trás de volta. Meu companheiro aprendeu por instinto, mas o "latido" do coiote me trás de volta em um baque que não é lá o mais confortável - mas funciona.

O som tem um papel fundamental nesse meu caminho de volta.

Mas com onze anos eu não sabia que isso tinha nome - transe- não sabia que meu caminho espiritual envolvia a jornada e o transe, não sabia que não precisava ter medo da sensação de beatitude que transformava meu pensamento em nuvens. Só o que eu sabia é que nunca era capaz de terminar de rezar o terço, mas me encontrava depois, respirando produnda e calmamente, o terço solto na mão, sem saber quanto tempo tinha passado.

Quando rompi com o cristianismo - fiz as pazes com isso muito depois, mas não foi uma saída fácil, era um momento de desconforto e trauma e perda de um pedaço da minha alma que só consegui resgatar três anos atrás- eu passei por um processo de busca que me levou na direção do oriente. Não sabia o que era ainda. Descobri Lobo. Fugi do caminho xamânico com todas as pernas que eu tinha. E desta vez, eu começava a caminhar sem rumo e quando me dava conta, não sabia como tinha chegado a um lugar, em um processo sem controle algum, onde eu podia cair no transe enquanto andava na rua. Estive muito perto da loucura.


A loucura é uma porta perigosa quando se trilha um caminho que presume sempre estar no limiar. Ela está ali, tentando morder o fundo da mente. Nem todo louco é um xamã - mas muitos são pessoas que estavam nesse processo e caíram.



Gostaria de poder dizer que dominei o processo. Mas seria mentira e aqui não há espaço para a mentira.

Dominei o processo de impedir que isso me tome por completo quando preciso evitar - na maioria das vezes. Água fria, um cigarro, certos movimentos e um segurar energias. Algumas vezes, ajuda se eu provocar uma dor, apertando um nervo por exemplo. As vezes fico estragada o resto do dia, até poder sentar e meditar e permitir o processo do transe aflorar em um espaço controlado. As vezes, dormir ou chorar ajuda.

Permitir que seu corpo seja usado por um espírito é uma das facetas do transe. A jornada é outro. E existe também um espaço dentro do transe que é um esvaziamento da forma, onde existe uma comunhão com o meio e a consciência se dissolve e tudo que fica é o compartilhamento.

Uma das coisas que me incomoda no paganismo atual é que não é dado o devido espaço a esse processo. E mesmo na umbanda, que é uma religião de transe, muitas casas não dão a atenção devida e deixam o médium "por sua conta e risco". Sim, existem pessoas como eu, que tem esse processo como algo muito simples - mas mesmo assim, eu tive o auxílio de uma médium experiente que me orientou a como bloquear isso se preciso e como impor limites quando em contato com certos espíritos e como poupar minha energia, e isso fez uma enorme diferença. Não se pode negar a possibilidade, e não se pode deixar o boi solto - os dois extremos que vejo.

A verdade é que ainda temos uma sociedade eurocêntrica onde o transe é visto como coisa de gente primitiva e inferior. Primitivo, sim - primordial e primeiro, não a visão pejorativa que se tem dessa palavra.Transe é tabu, infelizmente.

Tanto que muito mais se usa a palavra estado alterado de consciência. Eu gosto de transe. É uma palavra curta, e os estados alterados de consciência abarcam muito mais do que só esse aspecto.

Não tenho nenhuma conclusão bonita. Só queria deixar aqui anotado esse processo de como é que o transe se dá para mim.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Ainda sobre o Guerreiro - Caminho Quádruplo

Cada capítulo de um dos quatro caminhos (guerreiro, curador, mestre e visionário) termina com uma série de questões sobre aquele aspecto; reproduzo aqui as questões do guerreiro.
Acho pertinente para quem quer conhecer melhor o aspecto responder esses questionamentos, e a leitura dos comentários é muito ilustrativa do material que se encontra no livro.


Questões

Pense em suas respostas às questões que se seguem. Para desenvolver o Guerreiro interior, formule e responda diariamente as de número 1 e 2.

1-O que é bom, verdadeiro, belo, tão forte em mim quanto o que me sussurra que eu sou medíocre? (ou,na linguagem psicológica contemporânea, minha autoconfiança é tão forte quanto minha autocrítica?)
Se for capaz de responder sim a essa pergunta, você está pronto para fazer valer sua força ou medicina original, em qualquer situação. Se não puder responder "sim" a esta pergunta, você precisa trabalhar com as ferramentas de fortalecimento descritas nesse capítulo.

2-Em que ponto da minha vida parei de dançar? Em que ponto da minha vida parei de cantar? Em que ponto da minha vida parei de me encantar com as histórias que ouço? em que ponto da minha vida comecei a sentir desassossego no doce território do silêncio?
Muitos povos indígenas acreditam que quando pararmos de dançar, cantar, sentir encanto por histórias e começarmos a ter dificuldades diante do silêncio, é aí que termos começado a experimentar a perda da nossa alma ou espírito. Dançando o Guerreiro recupera aquelas partes do eu que se encontram perdidas ou esquecidas. Utilize-se dos cinco ritmos de Roth como ferramentas de recuperação da alma para se auto fortalecer.

3-Quais os líderes e pessoas que corporificaram o "espírito do Guerreiro", que me inspiraram e foram uma fonte de força na história e nos tempos atuais?
As pessoas que o inspiram, assim o fazem porque espelham aspectos de seu próprio Guerreiro interior, fazendo-o lembrar de sua própria e inerente capacidade de liderança. Faça uma lista ou colagem visual dessas pessoas para reforçar os dons do Guerreiro que esperam ser trazidos à luz.

4- Quais foram as pessoas que me agradeceram por minha capacidade de liderança? Quais foram as pessoas que me escolheram para fazer parte do seu time? 
Quando você é reconhecido ou escolhido por sua capacidade de liderança, este é o reconhecimento por sua medicina original, seu Guerreiro interior. 

5- Quais foram meus maiores desafios? De que maneira lidei com eles? 
Reveja os maiores desafios com os quais você já tenha se defrontado. Em que ponto você começou a encará-los com todo seu poder, e vez de evitá-los ou encolher-se de medo? O arquétipo de Guerreiro nos ensina que quando vamos com nosso pleno poder ao encontro de um desafio, colocamos em ação nossa capacidade de liderança e os talentos que são parte de nós. Quando encaramos os desafios com medo, experimentamos o aspecto sombra do Guerreiro.


6- Das três forças universais (a força da presença, da comunicação e do posicionamento), quais as que estão desenvolvidas e quais não? 
Quando, em sua vida, você esteve consciente do poder da presença? Quando em sua vida você experimentou a efetividade ou sua falta com relação a seu poder de comunicação? Quando em sua vida, você teve consciência do poder do posicionamento? O que você pode fazer para desenvolver os poderes que acha que estão pouco desenvolvidos?

7- Que capacidades específicas de liderança possuo? De que maneira, de fato, demonstro essa capacidade em minha família, com relação à minha criatividade, ou em minha vida profissional?

8- Quando perdi meu poder? Que tipo particular de pessoa ou situação aumentam minha falta de coragem? 
Onde e com quem não sou capaz de me apresentar completamento como sou?

9- Onde atuo por minha própria conta, sou auto-suficiente, tomo posições firmes e sei o que não suporto?
As situações nas quais você é capaz de fazer tudo isso lhe permitem experimentar sua autoestima e poder. Sempre que você estiver plenamente visível, e sabendo onde põe os pés, você estará experimentando o que significa estar em seu próprio poder. Trabalhe a prática da meditação em pé como uma forma de entrar em contato com seu verdadeiro eu e de ter a experiência do arquétipo do guerreiro.

10-Que partes de mim encontram-se agora em luta entre si? Qual o maior conflito que, de maneira geral, mais se apresenta em minha vida? Onde,em minha vida, crio desentendimentos? Eu digo o que quero dizer? Faço o que digo?
As duas maiores causas de mal entendidos que conduzem a  conflitos são: não dizer o que realmente queremos dizer e não fazer o que dizemos. Dedique alguns momentos durante a meditação em pé para pedir orientação sobre como poderia alinhar suas ações com suas palavras.

11- Como reajo quando há muito a fazer? Como reajo quando não há nada a fazer?
O líder competente se compromete a manter o equilíbrio pela administração da energia pessoal, tempo e recursos. A arte das cavernas nos revela a importância que era atribuída ao relaxamento e à concentração. As posturas chiltan e os desenhos dos homens-árvores demonstram como os antigos agiam para evitar a sobrecarga nas épocas de muita atividade, e se supriam de conforto nas épocas de inatividade. A natureza era mantida pelos povos antigos como fonte de reabastecimento e renovação. Lembre-se dos "três nãos" da liderança: "Quando houver muito a fazer, não tenha medo; quando nada houver a fazer, não se precipite; não dê opiniões sobre o que é certo e errado. Um líder que consiga ser bem sucedido nessas coisas não se deixará confundir ou iludir por coisas exteriores."

12- De que forma tenho dedicado honra e respeito a mim mesmo e aos outros? Tenho consciência de meus limites e determinações? Honro e respeito os limites e determinações alheios?

13-Em que aspectos de minha vida considero-me responsável e digno de confiança? Em que aspectos de minha vida sou disciplinado? 
Quando não somos responsáveis ou dignos de confiança ficamos sujeitos aos desígnios alheios. Quando não somos disciplinados ou capazes de ser "discípulos de nós mesmos", nos sujeitamos à confusão e ao caos.

14-Qual é minha ligação coma a natureza e com os animais? Passo pelo menos uma hora diária ao ar livre?
A boa saúde e o bem-estar exigem que passemos pelo menos uma hora por dia ao ar livre. Organize seu tempo para fazer isso.
Quais são meus animais preferidos? Nossos animais preferidos,em algumas tradições nativas, são conhecidos como animais aliados. Você consegue identificar seu animal aliado?
Existe algum animal em particular do qual eu sempre tenha gostado ou pelo qual sempre senti uma atração desde a infância? esse pode ser seu "animal de poder". Você possui um animal de poder?

15-Dentre os três aspectos sombra do Guerreiro, quais os padrões de invisibilidade que já experimentei?Em que circunstâncias de minha vida fui um rebelde, tive problemas de autoridade ou passei pela experiência de fazer-me de vítima?
Os aspectos sombra do arquétipo do Guerreiro revelam aspectos da capacidade de liderança que estão esperando por serem reconhecidos. Trabalhe com as ferramentas de poder do Guerreiro descritas nesse capítulo para trazer à tona ou liberar o poder que está adormecido em você.

Alguns trechos do livro O Caminho Quádruplo

Digitei uns trechos sobre o aspecto do guerreiro retirados do livro O Caminho Quádruplo - trilhando os caminhos do guerreiro, do mestre, do curador e do visionário, em uma ótima discussao sobre o aspecto do Guerreiro.

Coloca aqui para quem puder achar útil...


‎"As sociedade indígenas de todo o mundo se relacionam com o processo de fortalecimento por meio do tema mítico e da expressão arquetipica do Guerreiro. Ao longo da história, homens e mulheres que exploraram o caminho do Guerreiro foram chamados de líderes,protetores,magos,aventureiros e exploradores. (...) O princípio que guia o Guerreiro é: mostrar-se e optar por estar presente. O Guerreiro desenvolvido demonstra honra e respeito por todas as coisas, faz uso da comunicação criteriosa, estabelece limites e determinações, é responsável e disciplinado, faz uso correto do poder e entende os três poderes universais (presença,comunicação e posicionamento)."
 
Ela coloca que as ferramentas de poder do guerreiro são o chocalho, a dança, a meditação em pé e os animais de poder.
 
Sobre meditação em pé:
 
"Meditação em pé
O Guerreiro se utiliza do ritmo do silêncio para atingir a integração dos poderes de presença,comunicação e posicionamento. As tradições xamânicas fazem uso da posição em pé e do ritmo do silêncio para treinar os indivíduos na arte de atingir o completo poder sobre si mesmos. Não é raro, nessas sociedades, que os sujeitos orem em pé, por longos períodos de tempo, quando procuram obter visões. Transculturalmente, a prática da meditação em pé é utilizada nas artes marciais, nas práticas espirituais e entre os militares como um meio de reforçar e fazer fundirem-se os três poderes universais da presença, da comunicação e do posicionamento, os quais nos permitem a ligação com nosso ser maior. No Tao Te Ching,Lao Tzu nos recorda a maneira pelo qual o Guerreiro se utiliza e compreende o poder e a dança da vida:
Conhecer o absoluto é ser tolerante
O que é tolerante torna-se imparcial;
O que é imparcial torna-se poderoso;
O que é poderoso torna-se natural;
O que é natural torna-se Tao.

A procura pelo eu em seu pleno funcionamento promete ser o mais frutífero empenho que um líder pode assumir. Ser cheio de poder- poderoso - é a instância natural de tolerância, respeito e imparciabilidade do caminho do Guerreiro."
 
Depois, na descrição da prática meditativa, ela coloca: 
 
"Durante esse tempo e postura sagrados, você é capaz de sentir como é manter-se de pé, sozinho. Ter literalmente os dois pés no chão, tomar uma posição firme, ser independente. Na meditação em pé você experimento o que significa estabelecer limites a partir de um espaço de respeito por si mesmo e auto estima. . (...) Expressar o Guerreiro Interior significa estar atento e presente, sem esforço ou repressão. É a capacidade de ter a posse de sua própria presença e poder pessoal sem desistências ou desvios. Na meditação em pé você experimenta o que significa trabalhar a partir de uma postura de respeito: a disposição para "olhar de novo" a si mesmo e aos outros tendo como base uma posição de força e flexibilidade."
 
 
 

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Leitura

Quando sua forma de vivenciar o xamanismo escapa do óbvio que se espera e sai do eixo ameríndio, você tem um problema. Porque se você jogar "xamanismo" ou "shamanism" no google imagens, repare só, vão aparecer basicamente imagens nativo americanas.

Quando conheci algo de xamanismo mongol eu me senti tocada. Muito ali fazia sentido. Muito ali era aquilo que eu sentia. E muitas coisas que eu fui orientada a fazer encontrava ressonância ali.

Mas não sou da turma que se fia só em intuição, sabe. Sinto necessidade de estudar.

E então encontrei esse livro, Chosen by the spirits, de autoria de uma xamã chamada Sarangerel. Já estou encomendando o outro livro dela.

Estou perto do fim do livro, e ele vai render muitas postagens...

domingo, 15 de maio de 2011

E no retorno de Paranapiacaba, um retorno maior.

Estive este fim de semana em Paranapiacaba para a 8ª Convenção de Bruxas e Magos. É um ambiente plural. Lá se encontra de tudo. Tem gente que sabe o que está fazendo, gente que nem tanto, tem palestras muito boas e muito ruins. Tem gente boa e gente a quem eu não confiaria nem uma palha seca. Tem novatos e dinossauros de todos os caminhos. Eu considero isso um dos pontos a favor da convenção. Essa possibilidade de ver de tudo, e de ouvir diferentes visões. Essa troca. E se as pessoas querem se vestir de um jeito ou de outro, quem se importa? Se ali as pessoas se sentem a vontade para usar vestes rituais no meio da rua, já que a convenção ocupa a vila inteira, que bom!

Eu fico discreta. Uso minhas roupas de todo dia. Mas escolhi meu colar preferido, um colar grandalhão, krahô, aquele que não costumo usar porque as pessoas sempre querem saber do que é feito e sempre se chocam em saber que é feito de pontas de casco de veado, que fazem meu movimento ser acompanhado de um suave som de chocalho.

Escolhi quantas atividades ligadas ao xamanismo eu consegui acertar no horário que tinha. Foram todas bastante diferentes. Mesmo na mais simples, que foi menos intensa, aprendi e pensei.

Pensei muito. O dia inteiro.

Enquanto andava, depois de uma noite sem dormir e em jejum até quase as três da tarde porque não parei tempo suficiente para comer, pensava em como sinto que preciso ser mais disciplinada para conseguir seguir adiante com constância. Pensei em tudo que tenho passado e em tudo que não tenho feito e deveria.

Minha imensa capacidade de falhar nunca deixa de se mostrar, eu pensava.

Mas as coisas são curiosas. Elas nos surpreendem, sempre. Ainda mais quando estamos pensando tanto assim.

A primeira coisa que percebi foi que eu me convenci de que sou indisciplinada e bagunceira. Mas me disseram, e eu me surpreendi, que sou organizada e organizadora, que coloco as coisas nos lugares delas. E que vejo as coisas que os outros não vêem. Depois lembrei de um texto que li, sobre criatividade, e lá falava que nós nos convencemos de que somos os rótulos que as pessoas colocam sobre nós, assumindo isso como imutável. Ela fala que precisamos transformar esses rótulos e usar a nosso favor quem nós somos.

O dia foi passando. Descobri que a única coisa que me impede de tocar tambor direito é meu medo de errar. Aliás,é o medo de errar que mais me atrapalha. Que é muito fácil que eu toque tambor direito: basta que eu tente, que eu toque. A prática é que vai fazer com que eu aprenda.

Encontrei pessoas amadas. Conversei com pessoas desconhecidas. Orientei gente perdida, fiz gentilezas. Recebi gentilezas, muitas.

Expliquei para um garoto que acaba de descobrir o paganismo sobre porque o xamanismo causa estranhamento, sobre o que é xamanismo.

E no final, depois que a noite caiu e o escuro e o frio eram mais intensos, eu percebi que não é disciplina que eu preciso. Que meu problema é outro. É unidade o que eu procuro. É unidade o que eu preciso.

Na tentativa de viver cada pedaço da minha vida dentro de uma caixinha diferente com rótulo organizador, como a sociedade me mandou fazer a vida inteira, eu me perco. Porque minhas trilhas todas convergem em uma só. Porque tudo é parte de um mesmo todo.

Unidade. Sai de Paranapiacaba com isso.

Acabou que adquiri um chocalho novo. Um com a mesma origem do meu primeiro chocalho. Voltei ao princípio, e agora, posso caminhar adiante. Mais inteira. Em busca de uma unidade que me permita viver aquilo que devo viver.