quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Um pouco mais sobre vestes xamânicas

Como prometido, venho trazer algumas imagens de mantos xamânicos.

Cada manto é único, mesmo seguindo um padrão. Porque cada xamã é ligado a diferentes espíritos e porque o manto reflete o caminho pessoal de cada um.

A primeira imagem que vou compartilhar é uma imagem que mostra nativos do que hoje é o Canadá usando vestimentas de trabalho xamânico.

Xamãs Haida, 1881

Clique para ampliar

Reparem: o último a direita tem tatuagens no peito e ante-braço. Alguns usam máscaras. 

Outra imagem que eu gostaria de compartilhar me tocou profundamente, por perceber nela algumas das coisas que Lobo exigiu de mim:

A primeira foto é um xamã yukaghir, em 1902. A segunda é um manto ligado a cura, yakut, que passou de pai para filha e creio deva estar em uso ainda hoje. 


Duas imagens realmente tocantes são as que vou postar a seguir. A veste, completa, com  manto, toucado, botas, é do século XVIII e está conservada com incrível perfeição. Elas mostram a frente e as costas do manto:






















Eu gostaria de colocar mais algumas imagens, mas o post ficaria absurdamente pesado. 

De todo modo, é interessante notar como os "penduricalhos" das vestes tanto simulam asas e penas, na idéia do xamã ser capaz de "voar" espiritualmente, como refletem os espíritos auxiliares daquele xamã. No casodomanto yakut e do mongol, penduricalhos são acrescentados e nós nas franjas são feitos por aqueles que são auxiliados pelo xamã.

A última peripécia de "oh senhor, não sou esquizofrênica" com relação a meu manto foi que Lobo ordenou que ele tivesse certas franjas amarelas que não haviam feito o menor sentido para mim. Hoje,lendo um pouco  mais, descobri que elas são caracteristicas de alguns tipos de mantos xamânicos mongóis.  

Espero que no próximo post sobre vestuário xamânico eu já possa mostrar fotos de como o meu está sendofeito.

domingo, 7 de novembro de 2010

Lançando ossos







São de resina, não ossos reais. Mas cumprem sua função, não há como negar. A questão de jogar os astragali (astragali é plural de astragalus) veio da última jornada que fiz, em que simplificando, terminei olhando meus próprios ossos cobertos de grama, velhos já, e "colhendo" de entre minhas costelas cinco astragalus.

Por isso não me importei de usar ossos de resina, a princípio.

Eu tinha comigo um saquinho que eu fiz com outro propósito, mas que já acabou. Depois de limpar o saco de pano de tudo que estava impregnado nele, fisica e espiritualmente, foi a hora de buscar Eclipse.

Eclipse é meu tambor. Ele tem esse nome por ter sido feito com um bonito couro peludo malhado. A mancha branca dele parece a sombra de um eclipse. Eu mesma o fiz, mas ainda não sei tocar direito e com isso não o uso tanto quanto ele mereceria ser usado.

Defumei o saquinho de pano com sálvia e alecrim, defumei o espaço com eles. E comecei a bater o tambor. Foi um toque feio, sabe. Não tenho ainda muita habilidade com isso. Mas vamos nos virando. Demorou mas peguei um ritmo e consegui ir. O tambor tocava no automático enquanto eu viajava em busca de quem um espírito que pudesse me ajudar com o oráculo dos ossos.

Me surpreendi quando Ovelha apareceu.

Perguntei o que ele queria em troca de me ajudar, e ele, com o mal humor arrogante que emana dos carneiros, disse "três meses sem usar lã". Eu aceitei sem titubear e ele disse para eu pendurar no saquinho uma miniatura de crânio de ovelha ou algum outro objeto que marcasse aquilo para ele.

Agora, estou aqui, aprendendo a lançar os ossos e esperando conseguir o favor do carneiro...

(sim, o carneiro que me apareceu era um herdwick, como o da foto, mas todo claro)

sábado, 16 de outubro de 2010

Porque a Loba manca?

Quando eu buscava por uma identidade para este blog, eu passei por uma dificuldade. Lobo é o professor que aceita todos os alunos. E cada nome que cita o lobo que eu pensava era mais bizarro, pedante ou lugar comum que outro.

Eu sinceramente acho que alguém que quer ser apadrinhado pelo Lobo "porque é legal" deve ser meio maluco, ou não leu as letras pequenas do contrato. Quem me conhece sabe que eu não sou das pessoas que ficou super empolgada por ter um totem tão popular. Aliás, durante uns ans eu duvidei, se aquele que eu via era mesmo o Lobo, ou se eu estava identificando errado outro canídeo. Hoje eu sei que o lobo europeu é bem diferente de um lobo ártico. Lobo não é felpudo e branco, mas magro, ombros largos, escuro, o pelo mesclado de preto e marrom, o próprio lobo da chapeuzinho vermelho.

Amo Lobo. Entendo porque ele me escolheu e agradeço todos os dias porque nenhum professor seria tão paciente. desde criança, Lobo já estava lá. No zoológico, os lobos agitados, o lobo que parou o mais perto possível de mim e me encarou nos olhos. As brincadeiras, onde eu sempre era um lobo. Minha relação de cuidado e ensino com o mundo e as pessoas.

Mas eu não sou aquela que chama atenção, que conhece tudo, que faz tudo certo. Eu sou aquela que sobrevive como pode e é isso ai.

E eu sou manca. As vezes, só um pouquinho. As vezes, puxo a perna de um jeito que não se pode evitar ver. Meu joelho dói sem parar já fazem alguns anos. Acostumei com isso até.

E foi assim, pensando em como poderia dar um nome que não parecesse "wannabe" e que não soasse pedante, um nome que pudesse tirar um riso inicial e quebrar a desconfiança de que eu queria aparentar mais do que sou,  e ainda assim que honrasse Lobo, que virei a Loba Manca.

E é isso. A resistência do lobo, capaz de sobreviver a tudo, e mesmo mancando, não parar de andar.

Se vestindo para o trabalho

Já fazem alguns anos que o Lobo disse que eu deveria fazer uma veste para quando eu fosse trabalhar com questões xamânicas. Na minha última jornada com tambor, eu me vi vestida com esse manto ou capa, e entre outras coisas, decidi que era hora de assumir esse compromisso de uma vez.

Fui em busca dos espíritos para que me mostrassem como deveria ser a veste, e eles me mostraram, em detalhes, como deveria ser.

Levei ainda um mês para conseguir começar a comprar o material necessário para confeccionar tudo, mas hoje finalmente consegui os principais itens de que necessito. Estou muito feliz, porque me surpreendeu que eu conseguisse achar o que fui instrída a procurar, mesmo que tenha andado por mais de três horas em lojas de material para confecção de bijuterias na 25 de março.

Numa veste xamânica, tudo tem um significado, ou seria melhor dizer, uma utilidade. Eu não vou mentir: não sei para que serve cada coisa que vai estar na minha veste. Agora a pouco entendi o motivo de um dos principais itens dela ser como é! Lobo não me deu explicações sobre isso: disse o que devia ser feito, não porquê. É assim que ele ensina, me forçando a fazer, a pensar, a buscar.

O que posso dizer é que embora ela tenha algumas coisas relacionadas a Lobo, forma geral ela está ligada a mim e as minhas experiencias, e vai ir se modificando e alterando conforme eu conseguir me desenvolver no caminho. É genial ver como as coisas vão ganhando um sentido, conforme estudo sobre esse tipo de veste. Eu não sabia como elas costumam/costumavam ser, principalmente dentro do xamanismo europeu e asiático (que acaba sendo muito mais o meu trabalho do que o nativo americano, em muitos aspectos), e me surpreendo cada vez mais em ver como aquilo que Lobo me instruiu é similar a essas tradições.

Espero em breve poder falar mais longamente sobre como ela está ficando, e prometo em breve trazer alguma informação mais e algumas imagens de vestes tradicionais.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Jejuns, restrições e coisas assim

Comecei a jejuar porque Ele mandou. Obedeci sem questionar. Quando contei aos outros, não sei, senti que talvez fosse um pedido surpreendente. Porque Ele é vulgarmente conectado com o exagero, especialmente alcoólico, com a alegria e os banquetes.

Ainda assim, eu não questionei seu pedido. Porque sim, ele é o Senhor da Dança e da Alegria, mas também é aquele que morre e retorna, é aquele que chorou por nós- nós bebemos o seu sangue para nos libertar. Quando sinto suas mãos em meus ombros, sinto que ele é infinita beatitude mas também infinita melancolia. Ele é paradoxal em muitas coisas.  



E principalmente - ele é um deus xamã.


No primeiro ano, jejuei desde o equinócio de primavera até o solstício de verão, duas vezes por semana, ficando até o por do sol ingerindo apenas líquidos. Conforme o verão se aproxima, os dias ficam mais longos e também o jejum.

Quando o equinócio passou, eu parei os jejuns assim, feitos sempre duas vezes por semana. Fazia jejum nos dias sagrados, quando ia fazer trabalhos espirituais, mas cotidianamente, parei até chegar o equinócio de primavera. Novamente, de setembro a dezembro, jejuei duas vezes por semana.

Agora, estou jejuando pela terceira vez. Não é uma mortificação - não sou cristã, então meu jejum não tem esse sentido. É uma purificação, sim. E principalmente, entendo agora porque ele pediu isso, é uma forma de me concentrar nEle, no meu trabalho espiritual, e deixar o corpo fora do seu padrão cotidiano. Forço meu corpo a um outro ritmo, e clareio a mente.

Quando preciso trabalhar com o transe, já percebi que o jejum torna muito mais fácil o sair do meu estado normal de consciência. O jejum é uma ferramenta do meu preparo espiritual. Eu me privo de algo físico e com isso abro espaço para a meditação e para o espírito.

Este ano, não tenho mais um grupo que dê suporte ao meu trabalho espiritual. Me questionei se deveria continuar com o jejum, e quando me dei conta já havia cumprido vários dias apenas tomando líquidos do nascer ao por do sol.

Além disso, decidi por em prática algo que estava reticente em fazer. Em sonho, Ele apareceu para mim já fazem alguns meses e sugeriu que eu parasse de fumar. Não foi uma ordem, mas um pedido.

Decidi que durante a temporada de jejum, também vou me abster do cigarro. Uso o tabaco como um remédio para a ansiedade, um foco para conversas que exigem inspiração. Fumo muito pouco, só em ocasiões assim, mas mesmo assim, Ele pediu que eu parasse, então porque não obedecer? 


Durante meus jejuns, normalmente bebo leite, suco de laranja ou de uva, e uma eventual caneca de caldo quente. Bebo muita água. Na maioria das vezes, bebo um copo de leite adoçado pela manhã, goles de suco durante o dia (preparo 1/2 litro de suco para o dia todo), um copo de leite no final da tarde, e rompo o jejum comendo uvas ou pão de canela. Mesmo depois de rompido o jejum, evito comer coisas que não se relacionem a Ele, ou alimentos muito industrializados. O que me cai melhor é carne mal passada e pão, mas eu como muito pouca carne no meu dia a dia, então deixo isso para momentos especiais do processo.



Eu gosto desse processo, mas ainda estou longe de domina-lo. Este é o terceiro ano do jejum de primavera, e começo a pensar em que talvez eu possa como os hindus jejuar na lua nova e na lua cheia. 

Hoje, meu corpo está leve, e embora não tenha conseguido meditar ou orar mais longamente, me sinto satisfeita.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

divagação

Quando eu leio sobre xamanismo, eu me sinto esquisita. Sei bem o porquê. É como se eu pudesse ouvir uma miríade de plantas, animais, espíritos indefiníveis, que me envolvessem por trás e sussurrassem nos meus ouvidos.

Quando eu descobri que tinha essa habilidade de ver/ouvir e sentir coisas etéreas, eu não sabia o que fazer.  Sinceramente, ainda não sei. Só sei que começo a sentir a "eletricidade estática" e meu estômago gruda nas costas enquanto minha respiração ganha um ritmo lento, porque entre uma respiração e outra o pulmão me pede para ficar vazio por mais uns instantes.

Será que um dia eu vou cumprir este caminho como deve ser? Será que tenho força de vontade e disciplina?
Eu tenho tanto medo de falhar. Eu me sinto fraca e só. Então eu fecho os olhos e não consigo mexer o corpo, e sinto as presenças protetoras que me guiam, meu agathodaemon, Lobo, a Trepadeira, e outros que não sei quem são. Eles me pacificam. Eles me fazem sentir que sim, eu posso ir adiante, e que aquilo que eu sinto não é ruim ou errado.

Lobo, Coiote e o papel de cada um

Ontem eu e um amigo estávamos conversando pelo instant messenger. Eu reclamava porque a trilha do lobo tem que ser uma trilha de perda, de dificuldades inerentes. Ele reclamava do sofrimento de ser paradoxo o tempo tod e equilibrar coisas que são impossíveis de se equilibrarem. 

Durante algum tempo, nós reclamamos "porque não posso ser do Porquinho da Índia?" sabe, uma vida pacífica e segura. Mas logo nós estávamos rindo disso tudo.

Fiquei pensando em como é importante sermos diferentes E em como na vida em comunidade tudo é necessário. Eu sou a pessoa que está em pé quando precisam de alguém em pé, porque já quebrei tantas vezes que aprendi a resistir a terremotos. Eu sofri tantas perdas que me tornei capaz de aguentar e ajudar os outros. Eu odeio ensinar, mas me vi vestindo o manto de professor o tempo todo. Ele, meu amigo, é aquele com quem eu sei que posso falar dessa angústia porque ele carrega a risada e a dor, e sabe quebrar minha seriedade lupina quando é hora de brincar. Nossas angústias nos ensinam a carregar a alegria dentro de nós, mesmo quando tudo parece estar se esfacelando.

Somos necessários nas comunidades de que fazemos parte tanto quanto são necessárias as pessoas seguras e firmes e pacíficas. E quando nós precisamos de segurança, encontramos nessas pessoas. E quando o calo aperta e é preciso a resistência do lobo, eu posso ensinar. E cada um cumpre seu papel, e cada um se envolve e carrega sua parte no plano todo.

As vezes me cansa andar de barriga vazia, as dificuldades financeiras, as dificuldades espirituais, a sensação de ser traída porque se entrega com tudo. Mas eu sei que esse é meu papel. E sei que embora me falte em algumas áreas, em outras coisas sou rica.

Eu me sinto feliz quando ensino e quando me procuram para aprender, e eu fico feliz quando sinto a presença do Lobo. Eu me sinto gloriosa quando ele me ensina e sei que outro já teria perdido a paciência (porque sou a pessoa mais inconstante e teimo em tentar fugir do chamado).

Eu ainda estou querendo que uma caça bem gorda caia do céu no meu caminho e as coisas fiquem fáceis ao menos por algum tempo. Mas apesar das reclamações, é bom ler, ver e ouvir e perceber que estou no caminho certo e que esse é o caminho que eu devo seguir.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Me apresentando

Não sou uma novata. Estou trilhando essa já faz mais de uma década. Mas sempre fui um bicho meio sozinho. Dois anos que passei com outras pessoas, aprendi tanto, tanto. Agora, tou sozinha de novo. E esse sentimento de solidão me mata. Então,decidi escrever aqui. Mesmo que seja para falar sozinha com as paredes.

Para falar de xamanismo, de trabalho espiritual, de espíritos, de coisas assim. ficando meio na moita sobre identidade, para me sentir mais a vontade de falar.

E é isso. Bem vindos à casa da Loba Manca.